A Raíz do Medo
Tenho grades.
Largas.
Prateadas como as tuas.
Tenho asas.
Mapas.
Com o esqueleto das luas.
Tenho garras.
Frias
Alimentando um dragão.
Tenho ferros,
Cordas,
E carris no coração.
Entretanto, sobro em tempo
Com a raíz da maldição.
03/12/1998
Apresento-te às serpentes
Aos bosques e às hienas.
Apresento-te aos dragões
Que moram nos meus poemas
Apresento-te às lajes
Onde não existe um fim.
Enche teu corpo com lobos
Vais entrar dentro de mim.
18/10/1998
Notícias do Sangue
Hei, tu aí!
Em frente ao espelho
Não ouves as luas
Nos olhos de um velho?
Não ouves os lobos
No lago doente?
Os loucos na rua
Chorando aguardente?
E tu, junto ao espelho,
Ficando indiferente!
E fazes a barba
Olhando p’ro lado,
Não vás ver os ossos
E o sangue de um escravo.
Não vás ver nos cortes
Os berços da guerra,
As luas de palha
Poemas de pedra.
Não sentes os dedos
Dos dias pisados?
Meninos de gelo
No céu, enforcados?
E tu, junto ao espelho
Matando cigarros.
Já sabes.
Que uns são noite
E outros poesia.
Uns são violência
E outros sangria.
E tu, junto ao espelho
À espera do dia.
Deixa estar os poemas
Essas coisas doentes,
Não vão crescer-te asas
E rosas nos dentes.
Permanece quieto
Cadáver de estanho
Um dia cinzento
Não morre vermelho;
E vá ...
Tenta outra vez
Nascer agarrado
À sombra de um estranho.
26/11/1998
Os anjos do Tempo
Aonde iremos, nós, ó seres
Cinzentos, de olhos brandos?
Vamos na espuma dos dias
Arrastados pelos anos?
Ou seremos nós atrozes
Arrumadores de oceanos?
Só sei que os anjos do tempo
Ganham feições de tiranos.
Aonde iremos nós, ó seres,
Calados sem um olhar?
Será que o barco aonde vamos
É que nos faz navegar?
Em que porto é que ficámos?
Que corpo nos resta amar?
Só sei que os anjos do tempo
Prometeram não falar.
Aonde iremos nós ó seres,
Olhos vazios como poços?
Será que Deus acordou
E o que viu foram só ossos?
Ou será que até gostamos
De desenterrar destroços?
Só sei que os anjos do tempo
Juraram não serem nossos.
29/03/1998
As Bibliotecas dos Assassinos
Vivo nas bibliotecas dos assassinos
Entre os degraus do inferno
E os cadáveres de gelo e de neve.
Vivo entre os anjos nervosos e decepados
Celebrando festins inúteis
E imitando o Outono e a intolerância das bruxas.
Vivo nas olarias do egoísmo
Onde se confunde o deserto com as lágrimas,
As estrelas com o luto
Onde se pilham astros como se de cobre se tratasse.
Vivo na torre das cinzas.
Num arquipélago cego
Onde se bebe a memória com monstros
Nos palheiros do impossível e da doença.
Daí ...
Amar a lua ajoelhada nos matadouros.
Daí alugar os meus olhos
Às lajes vazias.
Daí ferir os Domingos
E beber veneno.
Daí assassinar os meus cavalos e cuspir amor.
Vivo nas bibliotecas dos assassinos
Entre os livros das chagas e os manuscritos do sangue
Entre o perfume das noivas virgens e frias
E a primeira viúva que criei
Entre o desastre iminente
De querer e não querer voltar do fim.
Por isso, piso os cabelos e as entranhas dos bosques,
Assalto e violo as filhas do entendimento,
Perfuro as carnes e as unhas
Com os últimos dias que restam.
Por isso, também eu me tornei um assassino.
BARCAS NEGRAS DE OUTUBRO
Eu vim das barcas mais negras de Outubro
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