sábado, 10 de dezembro de 2011

Lisboa à chuva

Onde iremos dormir esta noite, Julieta?

Quando eu perdi os meus poemas

E tu deixaste a alma no restaurante

Num carro à chuva

Podemos esconder os nossos corpos

E, por dentro do teu vestido

Eu posso acordar a ponte.



Bem sabes que os Romeus

Estão a sangrar das próprias sombras

E que do lago dos teus olhos

Se vê a lua.



No espelho retrovisor

Não existe ontem nem hoje.

Só o Tejo.

Velho Tejo

Ameaçando canções.





Tudo é possível esta noite, Julieta.

O meu coração transformou-se numa rosa

E não ousa adormecer.





Para lá da incompreensão

Temos as terras estranguladas da voz.

Para lá da máquina do céu

Temos a respiração das estrelas.

Para lá da arquitectura dos anos

Temos as máscaras do tempo.

Vamos apanhar depressa

Os pedaços do nosso amor

Antes que os cabelos brancos

Comecem a doer.





Amanhã temos de acordar cedo, Julieta.

Agarramos de novo o mapa,

Desenterraremos dos olhos

Duas torres de silêncio

E caminharemos tão depressa

Que nem a vida tenha tempo de perguntar onde vamos.





Amanhã já é tarde, eu sei!

Os dias vão deitar-se na nossa cama

A contar-nos segredos terríveis.

Por isso, solta os cabelos, Julieta.

Arranca-me a rosa do peito

E oferece-a à chuva.



Antes do dia nascer estaremos casados.


1995





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